quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Pequena elegia de setembro


Não sei como vieste,
mas deve haver um caminho
para regressar da morte.
Estás sentada no jardim,
as mãos no regaço cheias de doçura,
os olhos pousados nas últimas rosas
dos grandes e calmos dias de setembro.

Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?

Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.

Com que palavras
ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?

Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim.

Eugénio de Andrade


(Copiei do Blog felling´s Felling´s,por ter me tocado profundamente,lembrando minha irmã e minha mãe,que costumavam sentar a olhar as flores de nosso sítio,e que de nós tres,só eu ainda estou aqui,e um vazio imenso me invade quando olho p a varanda e as cadeiras estão vazias...elas não estão mais lá...mas eu ainda as vejo...também à olhar as rosas...que saudade...)

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Mães...

A canção de qualquer mãe - por Lya

Que nossa vida, meus filhos, tecida de encontros e desencontros, como a de todo mundo, tenha por baixo um rio de águas generosas, um entendimento acima das palavras e um afeto além dos gestos – algo que só pode nascer entre nós. Que quando eu me aproxime, meu filho, você não se encolha nem um milímetro com medo de voltar a ser menino, você que já é um homem. Que quando eu a olhe, minha filha, você não se sinta criticada ou avaliada, mas simplesmente adorada, como desde o primeiro instante.

Que, quando se lembrarem de sua infância, não recordem os dias difíceis (vocês nem sabiam), o trabalho cansativo, a saúde não tão boa, o casamento numa pequena ou grande crise, os nervos à flor da pele – aqueles dias em que, até hoje arrependida, dei um tapa que ainda agora dói em mim, ou disse uma palavra injusta. Lembrem-se dos deliciosos momentos em família, das risadas, das histórias na hora de dormir, do bolo que embatumou, mas que vocês, pequenos, comeram dizendo que estava maravilhoso. Que pensando em sua adolescência não recordem minhas distrações, minhas imperfeições e impropriedades, mas as caminhadas pela praia, o sorvete na esquina, a lição de casa na mesa de jantar, a sensação de aconchego, sentados na sala cada um com sua ocupação.

Que quando precisarem de mim, meus filhos, vocês nunca hesitem em chamar: mãe! Seja para prender um botão de camisa, ficar com uma criança, segurar a mão, tentar fazer baixar a febre, socorrer com qualquer tipo de recurso, ou apenas escutar alguma queixa ou preocupação. Não é preciso constrangerem-se de ser filhos querendo mãe, só porque vocês também já estão grisalhos, ou com filhos crescidos, com suas alegrias e dores, como eu tenho e tive as minhas. Que, independendo da hora e do lugar, a gente se sinta bem pensando no outro. Que essa consciência faça expandir-se a vida e o coração, na certeza de que aquela pessoa, seja onde for, vai saber entender; o que não entender vai absorver; e o que não absorver vai enfeitar e tornar bom.
Que quando nos afastarmos isso seja sem dilaceramento, ainda que com passageira tristeza, porque todos devem seguir seu caminho, mesmo que isso signifique alguma distância: e que todo reencontro seja de grandes abraços e boas risadas. Esse é um tipo de amor que independe de presença e tempo. Que quando estivermos juntos vocês encarem com algum bom humor e muita naturalidade se houver raízes grisalhas no meu cabelo, se eu começar a repetir histórias, e se tantas vezes só de olhar para vocês meus olhos se encherem de lágrimas: serão apenas de alegria porque vocês estão aí. Que quando pareço mais cansada vocês não tenham receio de que eu precise de mais ajuda do que vocês podem me dar: provavelmente não precisarei de mais apoio do que do seu carinho, da sua atenção natural e jamais forçada. E, se precisar de mais que isso, não se culpem se por vezes for difícil, ou trabalhoso ou tedioso, se lhes causar susto ou dor: as coisas são assim. Que, se um dia eu começar a me confundir, esse eventual efeito de um longo tempo de vida não os assuste: tentem entrar no meu novo mundo, sem drama nem culpa, mesmo quando se impacientarem. Toda a transformação do nascimento à morte é um dom da natureza, e uma forma de crescimento.

Que em qualquer momento, meus filhos, sendo eu qualquer mãe, de qualquer raça, credo, idade ou instrução, vocês possam perceber em mim, ainda que numa cintilação breve, a inapagável sensação de quando vocês foram colocados pela primeira vez nos meus braços: misto de susto, plenitude e ternura, maior e mais importante do que todas as glórias da arte e da ciência, mais sério do que as tentativas dos filósofos de explicar os enigmas da existência. A sensação que vinha do seu cheiro, da sua pele, de seu rostinho, e da consciência de que ali havia, a partir de mim e desse amor, uma nova pessoa, com seu destino e sua vida, nesta bela e complicada terra.

E assim sendo, meus filhos, vocês terão sempre me dado muito mais do que esperei ou mereci ou imaginei ter.

domingo, 24 de outubro de 2010


Súplica

Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

Miguel Torga

segunda-feira, 18 de outubro de 2010



Inteira...

Na sua falta, peguei todas aquelas suas frases feitas
que ficavam ao lado dos livros, na estante
e esqueci todas!

E aqueles dias lindos...
que pintava de cor de rosas
com essência de baunilha,
e depois embrulhava com fitas azuis da cor do céu,
dizendo que eram presentes...
Só pra me impressionar,
não nasceu ainda, nem um dia igual...

Aquele sonho que disse ser meu
e que era só desejar forte que a gente
poderia ter juntos, escapou...

Fiquei com meus dias quentes, aqueles de verão
que mesmo sozinha, consigo sonhar, consigo ter...
Consigo ouvir o vento passar,
que vira brisa com a nossa canção.
E que depois descobri ser só minha
e é a mesma que vive comigo desde sempre...

Fiquei com o que sou, fiquei comigo.
Fiquei com o que não viu,
com o que senti sem mudar.
Sim, eu fiquei com o que disse não existir...
Em meu mundo que você não viu...
Fiquei com o meu 'tudo'
E a sua falta, preenchi sem culpas,
com todo amor que transbordo...
E assim prossigo, sem a sua metade
e volto para mim, Inteira!

Karmona® (Dú se superou nesta poesia,lindíssima,tive de postar....maravilhosa, amiga amada,sem palavras!)

sábado, 9 de outubro de 2010

Crônica de Amor

Ha algum tempo recebi de uma amiga esse texto do Roberto Freire e o achei lindo. Combina muito comigo.


"Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem, caso contrário os honestos, os simpáticos e não- fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo a porta. O amor não é chegado a fazer contas, não obedece a razão.
O verdadeiro amor acontece por empatia, por magnetismo, por conjunção estelar. Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano. Isso são só referenciais. Ama-se pelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, ou pelo tormento que provoca. Ama-se pelo tom de voz, pela maneira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quando menos se espera.
Você ama aquela petulante. Você escreveu dúzias de cartas que ela não respondeu, você deu flores que ela deixou a seco. Você gosta de rock e ela de chorinho, você gosta de praia e ela tem alergia a sol, você abomina o Natal e ela detesta o Ano Novo, nem no ódio vocês combinam . Então?
Então que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobilizado, o beijo dela é mais viciante do que LSD, você adora brigar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome.
Você ama aquele cafajeste. Ele diz que vai e não liga, ele veste o primeiro trapo que encontra no armário. Ele não emplaca uma semana nos empregos, está sempre duro, e é meio galinha. Ele não tem a maior vocação para príncipe encantado, e ainda assim você não consegue despachá-lo. Quando a mão dele toca na sua nuca, você derrete feito manteiga. Ele toca Gaita de boca, adora animais e escreve poemas. Por que você ama este cara?
Não me pergunte. Você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais.
Gosta dos filmes dos irmãos Coen e do Robert Altman, mas sabe que uma boa comédia romântica também tem o seu valor.
...

terça-feira, 5 de outubro de 2010

"Porque eu?"...




Engraçado...ela deleta tudo que possa lembra-lo,não importa mais...ficou o vazio mesmo
...as gavetas,os arquivos do computador,os cadernos,tudo...
Guardou as ofensas,como uma forma de arrancá-lo para sempre de seu pensamento.Tanto tempo,e,engraçado...apesar do esforço,ficaram só as lembranças boas...ela se pega sorrindo as vezes,lembrando alguma brincadeira. Mas ela deletou tudo,menos a voz,o sorriso,a doçura,e também as "todas" vezes que tinha de dizer que era engano,ao telefone.Aliás,aquele telefone era uma droga...nunca pôde atende-la...
Ela viajou,ela partiu,ela voltou,ela chorou,esmurrou...aí ela riu,ela dançou,ela olhou para as estrelas,ela tentou de todas as formas deletar...tudo...mas ele,de alguma forma,sempre ficou,em todos momentos,junto a ela,feito tatuagem,não teve como apagar. Aí lembrou o dia que ele perguntou...."Porque EU"?.....e ela,não soube responder....em milhões de pessoas,porque ele?...e porque não passava?...foi deletado.
Um dia, olhando seus arquivos,reativando seu e-mail,seu msn,aparece a sua frente..."Como vais,meus lindos olhos"?.......ufa....como aquilo estava alí,ainda,se tudo foi deletado? E "Porque EU"?......seguido de uma risadinha dela,com um "não sei"!....Como ainda estavam alí?...olha a data,com o coração disparado...ei..."muito antigas as postagens",dos dias em que tudo terminou....pequenas mensagens de carinho,que foram guardadas pelo destino talvez,ou o pc resolveu salvá-las,sozinho,para serem lidas só agora...que nunca mais soube dele,como vai,se está bem.....só para dizerem que ele também sentia carinho por ela.Seus olhos se encheram de lágrimas,que ela secou rapidamente...acendeu um cigarro,e pensando,começou a entender,o "Porque EU?"....ela entendeu que ele tinha uma doçura diferente,especial,se despedia com "Um beijinho nessa boquinha linda",essas coisas que as mulheres gostam de ouvir,mas que era puro,ele sabia ser especial,talvez o tipo certo de cara errado...mas encantador. Nossa,como foi bonito ter encontrado estes pequenos mimos,vindos dele,afinal,ela sentiu que não só ela o "mimava" com palavras de carinho.
Ela desligou tudo,secou as lágrimas,e pensou...porque algumas pessoas são especiais,agora ela sabia Porque ELE.....uma pena....teria sido bonito...muito bonito....

(Crônica de autor desconhecido)

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